Quando a vida vem
A vida me veio às duas da manhã
Chegou de mansinho, e sem pedir licença, deitou-se ao meu lado
Dividimos o mesmo travesseiro e mesmo ainda sonolenta, senti sua presença
Tocou-me suavemente, como uma mãe – sei que ela é
Levou-me para mundos que eu não conhecia,
Queria me mostrar que se não levantasse da cama,
O tempo – que não tem culpa alguma – me engoliria.
Disse-me que tenta aparecer para todos, mas que não a enxergam
Lutam com a escuridão, vivem cheios de nada, vazios de tudo,
Fingem que vivem, que fazem o que amam quando não amam o que fazem.
Sentei-me encostada na cabeceira da cama e passei a ouvi-la
Estava tão deprimida, a pobre coitada!
Segurei-a pela mão e pouco a pouco, os soluços se foram
E com eles, ela também se foi,
Mas não me deixou.
Foi-se embora, mas ficou.
Felizes são os que deixam presenças mesmo quando partem,
Mais contentes ainda os que percebem, os que sentem.
Levantei-me da cama, chacoalhei os lençóis.
A vida ali comigo o tempo todo.
Abri as janelas, soltei os pássaros da gaiola – precisavam visitar mundos
E eu, fui com eles.
Dei um passo, dois, três e estava a voar!
Quem disse que precisamos de asas se podemos andar?
Um passo – um voo –, uma vida, mil mundos.
Bem-aventurados os que se vão, os que ficam, os que voltam,
Bem-aventurados os que vivem sem medir a grandeza das coisas,
O amor está na mediocridade.